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segunda-feira, 5 de novembro de 2018



Ressurreição - primeiro romance de Machado de Assis - publicado em 1872, obviamente, não é a sua obra-prima, mas já é um livraço!

Embora seja considerado um livro da fase romântica do autor, e apresente algumas características do estilo, percebemos um romantismo contido, moderado, sem os excessos sentimentais, já mostrando aquela pitada ácida que Machado tempera tão divinamente suas obras. É uma leitura rápida, fluída, envolvente, com uma reviravolta e um final (melhor nem falar desse final, só deixo registrado que eu amei!).

Temos aqui um romance psicológico (será o primeiro romance com esse viés escrito no Brasil?), onde, mais importante que a intriga é entender o caráter e o comportamento dos personagens. O próprio Machado, na Advertência da Primeira Edição, avisa: “Não quis fazer romance de costumes; tentei o esboço de uma situação e o contraste de dois caracteres; com esses simples elementos busquei o interesse do livro.” Ele escreveu o livro inspirado no pensamento de Shakespeare: “Our doubts are traitors, / And make us lose the good we oft might win, / By fearing to attempt” (Nossas dúvidas são traidoras e nos fazem perder o bem que frequentemente poderíamos ganhar, ao termos medo de tentar) e, vamos combinar, conseguiu: essa frase seria uma boa conclusão para a obra!

Vamos ao enredo: Dr. Félix é um médico de meia-idade que vive dos rendimentos duma herança. É um solteirão. Seus relacionamentos não duram mais do que seis meses, até que conhece Lívia, uma viúva e irmã de seu amigo, Viana. 

A história é narrada em terceira pessoa, por um narrador onisciente, e vai nos apresentando melhor o protagonista, Dr, Félix, um homem inseguro, que junto do seu amor por Lívia, conheceu o ciúme e a desconfiança, ao descobrir que seu amigo, Meneses, também está apaixonado pela nossa heroína (será a semente para criar o Bentinho?)...

Quando tudo parece estar se encaminhando para um desfecho feliz, eis que Félix recebe uma carta, que traz uma grande reviravolta para o desenrolar da trama (cabe aqui dizer que gostei muito da força moral da Lívia)...


Fica claro que o autor teve a intenção de nos apresentar um novo modelo de romance, com uma trama mais psicológica e trágica, ao nos deixar com a seguinte afirmação: “Não a há de alcançar nunca, porque o seu coração se ressurgiu por alguns dias, mas esqueceu na separação o sentimento da confiança e a memória das ilusões”.

sexta-feira, 2 de novembro de 2018

Cenário

Passei por essas plácidas colinas
e vi das nuvens, silencioso, o gado
pascer nas solidões esmeraldinas.

Largos rios de corpo sossegado
dormiam sobre a tarde, imensamente,
— e eram sonhos sem fim, de cada lado.

Entre nuvens, colinas e torrente,
uma angústia de amor estremecia
a deserta amplidão na minha frente.

Que vento, que cavalo, que bravia
saudade me arrastava a esse deserto,
me obrigava a adorar o que sofria?

Passei por entre as grotas negras, perto
dos arroios fanados, do cascalho
cujo ouro já foi todo descoberto.

As mesmas salas deram-me agasalho
onde a face brilhou de homens antigos,
iluminada por aflito orvalho.

De coração votado a iguais perigos
vivendo as mesmas dores e esperanças,
a voz ouvi de amigos e inimigos

Vencendo o tempo, fértil em mudanças,
conversei com doçura as mesmas fontes,
e vi serem comuns nossas lembranças.

Da brenha tenebrosa aos curvos montes,
do quebrado almocafre aos anjos de ouro
que o céu sustêm nos longos horizontes,

tudo me fala e entende do tesouro
arrancado a estas Minas enganosas,
com sangue sobre a espada, a cruz e o louro.

Tudo me fala e entendo: escuto as rosas
e os girassóis destes jardins, que um dia
foram terras e areias dolorosas,

por onde o passo da ambição rugia;
por onde se arrastava, esquartejado,
o mártir sem direito de agonia.

Escuto os alicerces que o passado
tingiu de incêndio: a voz dessas ruínas
de muros de ouro em fogo evaporado.

Altas capelas cantam-me divinas
fábulas. Torres, santos e cruzeiros
apontam-me altitudes e neblinas.

Ó pontes sobre os córregos! ó vasta
desolação de ermas, estéreis serras
que o sol frequenta e a ventania gasta!

Armado pó que finge eternidade,
lavra imagens de santos e profetas
cuja voz silenciosa nos persuade.

E recompunha as coisas incompletas:
figuras inocentes, vis, atrozes,
vigários, coronéis, ministros, poetas.

Retrocedem os tempos tão velozes
que ultramarinos árcades pastores
falam de Ninfas e Metamorfoses.

E percebo os suspiros dos amores
quando por esses prados florescentes
se ergueram duros punhos agressores.

Aqui tiniram ferros de correntes;
pisaram por ali tristes cavalos.
E enamorados olhos refulgentes

— parado o coração por escutá-los
prantearam nesse pânico de auroras
densas de brumas e gementes galos.

Isabéis, Dorotéias, Heliodoras,
ao longo desses vales, desses rios,
viram as suas mais douradas horas

em vasto furacão de desvarios
vacilar como em caules de altas velas
cálida luz de trêmulos pavios.

Minha sorte se inclina junto àquelas
vagas sombras da triste madrugada,
fluidos perfis de donas e donzelas.

Tudo em redor é tanta coisa e é nada:
Nise, Anarda, Marília… — quem procuro?
Quem responde a essa póstuma chamada?

Que mensageiro chega, humilde e obscuro?
Que cartas se abrem? Quem reza ou pragueja?
Quem foge? Entre que sombras me aventuro?

Quem soube cada santo em cada igreja?
A memória é também pálida e morta
sobre a qual nosso amor saudoso adeja.

O passado não abre a sua porta
e não pode entender a nossa pena.
Mas, nos campos sem fim que o sonho corta,

vejo uma forma no ar subir serena:
vaga forma, do tempo desprendida.
É a mão do Alferes, que de longe acena.

Eloquência da simples despedida:
“Adeus! que trabalhar vou para todos!…”
(Esse adeus estremece a minha vida.)




Cecília Meireles

terça-feira, 9 de outubro de 2018

“Eu disse: a lua está tão bonita que dói por dentro. Ele não entendeu. É tudo tão bonito que me dói e me pesa. Fico pensando que nunca mais vai se repetir, é só uma vez, a única [...]Nesse espaço branco de madrugada e lua cheia, preciso falar, e mais do que falar, preciso dizer. Mas as palavras não dizem tudo, não dizem nada. O momento me esmaga por dentro. O espanto esbarra em paredes pedindo exteriorização.” Caio Fernando Abreu

terça-feira, 2 de outubro de 2018

A artista iraniana Shirin Neshat (1957-) escreve em seu corpo uma história de discriminação da mulher no Islã.
A série fotográfica Mulheres de Alá nos faz com que o a gente se sinta emocionado, comovido e até incomodado por suas obras que vão além do entretenimento. Neshat demanda atenção, paciência e, às vezes, nervos de aço. Ela não erra na mira...
Seu filme Mulheres sem homens (2009), baseado no romance homônimo de Shahrnush Parsipur, mostra a vida de quatro mulheres na década de 1950 é outra obra que merece destaque. Recebeu o Leão de Prata no Festival de Veneza de 2009.


https://www.youtube.com/watch?v=0-sidrvyMUY

domingo, 30 de setembro de 2018

Filme Intolerância, de Griffith (1916). 

Retrata a crueldade humana através de quatro histórias de intolerância: a queda da antiga Babilônia, a crucificação de Cristo, católicos massacrando protestantes na Noite de São Bartolomeu e dois jovens apaixonados que são perseguidos e agredidos no meio de um conflito entre capitalistas impiedoso e trabalhadores em protestos moralistas ... 
Griffith é considerado o pai do cinema americano por ter usado em seus filmes recursos que hoje compõem a linguagem cinematográfica, como a montagem paralela, o primeiro plano, a câmera em movimento e o uso de rebatedores de luz. 


Que grata surpresa que foi ler A senhorita de Scuderi, de E.T.A. Hoffmann e tradução do Marcelo Beckes. Sinceramente, nunca tinha ouvido falar desse livro, mas como recebi um convite da amiga Robert para a leitura e discussão (e considero o gosto literário dela incrível) resolvi aceitar. É uma novela de 1820, com uma narrativa muito gostosa, fluída e envolvente, logo nos primeiros parágrafos me senti “sugada” para dentro do livro...
A senhorita de Scuderi traz um incrível protagonismo feminino em plena França absolutista. A trama tem como pano de fundo alguns assassinatos que estão ocorrendo numa sombria Paris - aqui cabe ressaltar como o clima de mistério e tensão foi bem retratado - no meio desses acontecimentos, nossa heroína de 73 anos, não vai medir esforços para descobrir quem está cometendo essas atrocidades.
Temos, com esse enredo delicioso, a primeira novela policial alemã que acabou inspirando outras obras importantes da literatura como, por exemplo, Os assassinatos da rua Morgue, de ninguém menos que Edgar Allan Poe!
Essa novela também irá nos apresentar um personagem com um certo “desvio de personalidade” o qual Dostoievski irá trabalhar em seu segundo romance, O Duplo (1846)...
Enfim, é uma obra incrível, cheia de suspense, ação, reviravoltas e romance.Super recomendo!

terça-feira, 3 de julho de 2018



"Ela é exatamente como os seus livros: transmite uma sensação estranha, de uma sabedoria e uma amargura impressionantes. É lenta e quase não fala. Tem olhos hipnóticos quase diabólicos. E a gente sente que ela não espera mais nada de nada nem de ninguém que está absolutamente sozinha e numa altura tal que ninguém jamais conseguiria alcançá-la. Muita gente deve achá-la antipaticíssima mas eu achei linda, profunda, estranha, perigosa. É impossível sentir-se à vontade perto dela, não porque sua presença seja desagradável mas porque a gente pressente que ela está sempre sabendo exatamente o que se passa ao seu redor. Talvez eu esteja fantasiando, sei lá. Mas a impressão foi fortíssima, nunca ninguém tinha me perturbado tanto."

Caio Fernando Abreu, sobre Clarice.

domingo, 24 de junho de 2018

Clarice no quarto de despejo

No meio do dia
Clarice entreabre o quarto de despejo
pela fresta percebe uma mulher.
Onde estiveste à noite, Carolina?
Macabeando minhas agonias, Clarice.
Um amargor pra além da fome e do frio,
Da bica e da boca em sua secura.
De mim, escrevo não só a penúria do pão,
cravo no lixo da vida, o desespero,
uma gastura de não caber no peito,
e nem no papel.
Mas, ninguém me lê, Clarice,
Para além do resto.
Ninguém decifra em mim
a única escassez da qual não padeço,
- a solidão -
E ajustando o seu par de luvas claríssimas
Clarice futuca um imaginário lixo
e pensa para Carolina:
- a casa poderia ser ao menos de alvenaria -
E anseia ser Bitita inventando um diário:
páginas de jejum e de saciedade sobejam,
a fome nem em pedaços
alimenta a escrita clariciana.
Clarice no quarto de despejo
lê a outra, lê Carolina,
a que na cópia das palavras,
faz de si a própria inventiva.
Clarice lê :
- despejo e desejos –

Conceição Evaristo

#ConceiçãoEvaristonaABL

sábado, 23 de junho de 2018

CAROLINA NA HORA DA ESTRELA

No meio da noite
Carolina corta a hora da estrela.
Nos laços de sua família um nó
– a fome.
José Carlos masca chicletes.
No aniversário, Vera Eunice desiste
do par de sapatos,
quer um par de óculos escuros.
João José na via-crúcis do corpo,
um sopro de vida no instante-quase
a extinguir seus jovens dias.
E lá se vai Carolina
com os olhos fundos,
macabeando todas as dores do mundo...
Na hora da estrela, Clarice nem sabe
que uma mulher cata letras e escreve
“De dia tenho sono e de noite poesia”.

Conceição Evaristo


#ConceiçãoEvaristonaABL

sexta-feira, 22 de junho de 2018


Estava aqui “vagando” pelo Facebook e vendo uma quantidade enorme de postagens falando de decepções, de que as pessoas não eram o que pareciam, que perdemos amigos que não eram amigos, traições, etc ... fico pensando: por que gostamos tanto do “papel de vítimas”? Por que insistimos em ver sempre o “copo meio vazio”? Por que jogamos para o outro a responsabilidade de suprir nossas carências, necessidades, enfim de nos fazer feliz? Por que acreditamos que está tudo “lá fora”?
O que vejo é uma falta de amor, não falo aqui de amor romântico, mas de amor em sua forma mais pura, de amor sem egos, sem projeções, sem padrões, sem porquês ... amor por amor! Amor que liberta! Um amor que precisa ser achado dentro de nós mesmos e por nós mesmos, para que ele nos tome por completo e se expanda por tudo e todos!
Acredito que está na hora de nos livrarmos desta visão fatalista da vida e começar a entender que a vida é feita de ciclos, de movimento! Só porque uma pessoa não está mais convivendo conosco no dia a dia não quer dizer que esta não seja mais nossa amiga; finais de relacionamentos trazem sempre a frase: “não deu certo”, como assim não deu certo? Claro que deu certo: deu certo por um tempo! Finais, afastamentos querem dizer que a roda da vida girou que novos laços se farão, alguns se soltarão e a vida segue seu bailado nos proporcionando novos encontros ou reencontros!
O mais importante disso tudo é a gente aprender a dançar com a vida, é parar de se sentir vítima de “amigos que não eram amigos”, de “amores que não eram o que pensávamos”, de projetar nos outros o que queremos, deixarmos de querer/exigir do próximo sentimentos, ações e, principalmente, de olhar o outro como gostaríamos que estes fossem e de carregar o fardo de ser o que os outros querem que sejamos, ou seja, eliminar as expectativas, as carências, o ego de querer ser perfeito, assim seremos mais livres, menos vítimas e, por conseqüência, mais felizes!

domingo, 3 de junho de 2018

"Coragem, às vezes, é desapego. É parar de se esticar, em vão, para trazer a linha de volta. É permitir que voe sem que nos leve junto. É aceitar que a esperança há muito se desprendeu do sonho. É aceitar doer inteiro até florir de novo. É abençoar o amor, aquele lá, que a gente não alcança mais."

Ana Jácomo

domingo, 6 de maio de 2018

A maior riqueza
do homem
é sua incompletude.
Nesse ponto
sou abastado.
Palavras que me aceitam
como sou
— eu não aceito.
Não aguento ser apenas
um sujeito que abre
portas, que puxa
válvulas, que olha o
relógio, que compra pão
às 6 da tarde, que vai
lá fora, que aponta lápis,
que vê a uva etc. etc.
Perdoai. Mas eu
preciso ser Outros.
Eu penso
renovar o homem
usando borboletas.





(Manoel de Barros)

terça-feira, 1 de maio de 2018

Em homenagem ao dia de hoje...

Obra: Operários
Autor: Tarsila do Amaral
Onde ver: Acervo do Governo do Estado de São Paulo
Ano: 1933
Técnica: Óleo sobre tela
Movimento: Modernismo

domingo, 22 de abril de 2018

De manhã escureço
De dia tardo
De tarde anoiteço
De noite ardo.

A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
O este é meu norte.

Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontem

Nasço amanhã
Ando onde há espaço:
— Meu tempo é quando.

(Vinícius de Moraes)

sábado, 21 de abril de 2018

"Quem olha com tristeza é porque é triste. O que está dentro é o que está fora. Meus tons são frios porque minha paleta vem da alma. Pinto o que sinto. Acho que não nasci para alegrar ninguém, sempre me senti um ciclista da vida que anda contra o vento. Se as pessoas percebem tristeza ou alegria é porque esses sentimentos vêm delas. A arte é essa busca no sentido." 

Iberê Camargo
Obra: Dentro do mato, Iberê Camargo

sábado, 31 de março de 2018



O que é belo numa obra de arte, o que muda a vida do espectador, está muito além do alcance de tal descrição. Chegue mais perto, leia histórias da arte mais detalhadas. Melhor, aproxime-se da própria obra. Melhor, ainda, crie alguma coisa. O que acontecer na arte daqui para a frente é com você. (Julian Bell, Uma nova história da arte, 2008)

domingo, 18 de fevereiro de 2018

É DE 1940, MAS PERFEITAMENTE ATUAL!



Sinto muito, mas não pretendo ser um imperador. Não é esse o meu ofício.
Não pretendo governar ou conquistar quem quer que seja. Gostaria de
ajudar a todos - se possível - judeus, o gentio... negros... brancos.
Todos nós desejamos ajudar uns aos outros. Os seres humanos são assim.
Desejamos viver para a felicidade do próximo - não para o seu infortúnio.
Por que havemos de odiar ou desprezar uns aos outros? Neste mundo há
espaço para todos. A terra, que é boa e rica, pode prover todas as nossas
necessidades.
O caminho da vida pode ser o da liberdade e da beleza, porém nos extraviamos. A cobiça
envenenou a alma dos homens... levantou no mundo as muralhas do ódio... e tem-nos feito
marchar a passo de ganso para a miséria e os morticínios. Criamos a época da velocidade,
mas nos sentimos enclausurados dentro dela. A máquina, que produz abundância, tem-nos
deixado em penúria. Nossos conhecimentos fizeram-nos céticos; nossa inteligência,
emperdenidos e cruéis. Pensamos em demasia e sentimos bem pouco. Mais do que máquinas,
precisamos de humanidade. Mais do que de inteligência, precisamos de afeição e doçura. Sem
essas virtudes, a vida será de violência e tudo será perdido.
A aviação e o rádio aproximaram-nos muito mais. A próxima natureza dessas coisas é um
apelo eloqüente à bondade do homem... um apelo à fraternidade universal... à união de todos
nós. Neste mesmo instante a minha voz chega a milhões de pessoas pelo mundo afora...
milhões de desesperados, homens, mulheres, criancinhas... vítimas de um sistema que tortura
seres humanos e encarcera inocentes.
Aos que me podem ouvir eu digo: "Não desespereis!" A desgraça que tem caído sobre nós não
é mais do que o produto da cobiça em agonia... da amargura de homens que temem o avanço
do progresso humano. Os homens que odeiam desaparecerão, os ditadores sucumbem e o
poder que do povo arrebataram há de retornar ao povo. E assim, enquanto morrem homens, a
liberdade nunca perecerá.
Soldados! Não vos entregueis a esses brutais... que vos desprezam... que vos escravizam...
que arregimentam as vossas vidas... que ditam os vossos atos, as vossas idéias e os vossos
sentimentos! Que vos fazem marchar no mesmo passo, que vos submetem a uma alimentação
regrada, que vos tratam como um gado humano e que vos utilizam como carne para canhão!
Não sois máquina! Homens é que sois! E com o amor da humanidade em vossas almas! Não
odieis! Só odeiam os que não se fazem amar... os que não se fazem amar e os inumanos.
Soldados! Não batalheis pela escravidão! Lutai pela liberdade!
No décimo sétimo capítulo de São Lucas é escrito que o Reino de Deus está dentro do homem
- não de um só homem ou um grupo de homens, mas dos homens todos! Está em vós! Vós, o
povo, tendes o poder - o poder de criar máquinas. O poder de criar felicidade! Vós, o povo,
tendes o poder de tornar esta vida livre e bela... de fazê-la uma aventura maravilhosa. Portanto
- em nome da democracia - usemos desse poder, unamo-nos todos nós. Lutemos por um
mundo novo... um mundo bom que a todos assegure o ensejo de trabalho, que dê futuro à
mocidade e segurança à velhice.
É pela promessa de tais coisas que desalmados têm subido ao poder. Mas, só mistificam! Não
cumprem o que prometem. Jamais o cumprirão! Os ditadores liberam-se, porém escravizam o
povo. Lutemos agora para libertar o mundo, abater as fronteiras nacionais, dar fim à ganância,
ao ódio e à prepotência. Lutemos por um mundo de razão, um mundo em que a ciência e o
progresso conduzam à ventura de todos nós. Soldados, em nome da democracia, unamo-nos...

domingo, 11 de fevereiro de 2018

CARNAVAL


A vida é uma tremenda bebedeira.
Eu nunca tiro dela outra impressão.
Passo nas ruas, tenho a sensação
De um carnaval cheio de cor e poeira...
A cada hora tenho a dolorosa
Sensação, agradável todavia,
De ir aos encontrões atrás da alegria
Duma plebe farsante e copiosa...
Cada momento é um carnaval imenso
Em que ando misturado sem querer.
Se penso nisto maça-me viver
E eu, que amo a intensidade, acho isto intenso
De mais... Balbúrdia que entra pela cabeça
Dentro a quem quer parar um só momento
Em ver onde é que tem o pensamento
Antes que o ser e a lucidez lhe esqueça...
Automóveis, veículos, (...)
As ruas cheias, (...)
Fitas de cinema correndo sempre
E nunca tendo um sentido preciso.
Julgo-me bêbado, sinto-me confuso,
Cambaleio nas minhas sensações,
Sinto uma súbita falta de corrimões
No pleno dia da cidade (...)
Uma pândega esta existência toda...
Que embrulhada se mete por mim dentro
E sempre em mim desloca o crente centro
Do meu psiquismo, que anda sempre à roda...
E contudo eu estou como ninguém
De amoroso acordo com isto tudo...
Não encontro em mim, quando me estudo,
Diferença entre mim e isto que tem
Esta balbúrdia de carnaval tolo,
Esta mistura de europeu e zulu
Este batuque tremendo e chulo
E elegantemente em desconsolo...
Que tipos! Que agradáveis e antipáticos!
Como eu sou deles com um nojo a eles!
O mesmo tom europeu em nossas peles
E o mesmo ar conjuga-nos
Tenho às vezes o tédio de ser eu
Com esta forma de hoje e estas maneiras...
Gasto inúteis horas inteiras
A descobrir quem sou; e nunca deu
Resultado a pesquisa... Se há um plano
Que eu forme, na vida que talho para mim
Antes que eu chegue desse plano ao fim
Já estou como antes fora dele. É engano
A gente ter confiança em quem tem ser...
(...)
Olho p'ró tipo como eu que ai vem...
(...)
Como se veste (...) bem
Porque é uma necessidade que ele tem
Sem que ele tenha essa necessidade.
Ah, tudo isto é para dizer apenas
Que não estou bem na vida, e quero ir
Para um lugar mais sossegado, ouvir
Correr os rios e não ter mais penas.
Sim, estou farto do corpo e da alma
Que esse corpo contém, ou é, ou faz-se...
Cada momento é um corpo no que nasce...
Mas o que importa é que não tenho calma.
Não tenciono escrever outro poema
Tenciono só dizer que me aborreço.
A hora a hora minha vida meço
E acho-a um lamentável estratagema
De Deus para com o bocado de matéria
Que resolveu tomar para meu corpo...
Todo o conteúdo de mim é porco
E de uma chatíssima miséria.
Só é decente ser outra pessoa
Mas isso é porque a gente a vê por fora...
Qualquer coisa em mim parece agora

Álvaro de Campos

sábado, 27 de janeiro de 2018

Wolfgang Amadeus Mozart nasceu em 27 de janeiro de 1756 na cidade austríaca de Salzburgo. 


Permanentemente belos e altivos, os deuses detém o poder encantatório de que tanto se admiram e louvam os mortais; na música, jurisdição lúdica da alma por excelência, seus demiurgos emulam o mesmo maravilhamento por oitiva. Dentre os mais destacáveis está: Wolfgang Amadeus Mozart.



terça-feira, 23 de janeiro de 2018


Oscar 2018


Indicados ao Oscar 2018.

Melhor Design de Produção:
Beauty and the Beast
Blade Runner 2049
Darkest Hour
Dunkirk
The Shape of Water

Melhor Fotografia:
Blade Runner 2049
Darkest Hour
Dunkirk
Mudbound
The Shape of Water

Melhor Figurino:
Beauty and the Beast
Darkest Hour
Phantom Thread
The Shape of Water
Victoria & Abdul

Melhor Edição de Som:
Baby Driver
Blade Runner 2049
Dunkirk
The Shape of Water
Star Wars - Os Últimos Jedi

Melhor Mixagem de Som:
Baby Driver
Blade Runner 2049
Dunkirk
The Shape of Water
Star Wars - Os Últimos Jedi

Melhor Curta de Animação:
Dear Basketball
Garden Party
Lou
Negative Space
Revolting Rhymes

Melhor Curta-metragem:
DeKalb Elementary
The Eleven O'Clock
My Nephew Emmett
The Silent Child
Watu Wote/All of Us

Melhor Trilha Sonora Original:
Dunkirk
Phantom Thread
The Shape of Water
Star Wars - Os Últimos Jedi
Three Billboards Outside Ebbing, Missouri

Melhor Efeitos Visuais:
Blade Runner 2049
Guardians of the Galaxy, vol. 2
Kong: Skull Island
Star Wars - Os Últimos Jedi
War for the Planet of the Apes

Melhor Montagem:
Baby Driver
Dunkirk
I, Tonya
The Shape of Water
Three Billboards Outside Ebbing, Missouri

Melhor Maquiagem e Penteado:
Darkest Hour
Victoria & Abdul
Wonder

Melhor Atriz Coadjuvante:
Mary J. Blige (Mudbound)
Alisson Janney (I, Tonya)
Lesley Manville (Phantom Thread)
Laurie Metcalf (Lady Bird)
Octavia Spencer (The Shape of Water)

Melhor Ator Coadjuvante:
Willem Dafoe (The Florida Project)
Woody Harrelson (Three Billboards Outside Ebbing, Missouri)
Richard Jenkins (The Shape of Water)
Christopher Plummer (All the Money in the World)
Sam Rockwell (Three Billboards Outside Ebbing, Missouri)

Melhor Filme Estrangeiro:
A Fantastic Woman
The Insult
Loveless
On Body and Soul
The Square

Melhor Documentário de Curta-metragem:
Edith+Eddie
Heaven is a Traffic Jam on the 405
Heroin(e)
Knife Skills
Traffic Stop

Melhor Documentário:
Abacus: Small Enough to Jail
Faces Places
Icarus
Last Men in Aleppo
Strong Island

Melhor Canção Original:
Mighty River (Mudbound)
Mystery of Love (Call Me By Your Name)
Remember Me (Coco)
Stand Up for Something (Marshall)
This is Me (The Greatest Showman)

Melhor Animação:
The Boss Baby
The Breadwinner
Coco
Ferdinand
Loving Vincent

Melhor Roteiro Adaptado:
Call Me By Your Name
The Disaster Artist
Logan
Molly's Game
Mudbound

Melhor Roteiro Original:
The Big Sick
Get Out
Lady Bird
The Shape of Water
Three Billboards Outside Ebbing, Missouri

Melhor Ator:
Timothée Chalamet (Call Me By Your Name)
Daniel Day-Lewis (Phantom Thread)
Daniel Kaluuya (Get Out)
Gary Oldman (Darkest Hour)
Denzel Washington (Roman J. Israel, Esq,)

Melhor Atriz:
Sally Hawkins (The Shape of Water)
Frances McDormand (Three Billboards Outside Ebbing, Missouri)
Margot Robbie (I, Tonya)
Saoirse Ronan (Lady Bird)
Meryl Streep (The Post)

Melhor Direção:
Christopher Nolan (Dunkirk)
Jordan Peele (Get Out)
Greta Gerwig (Lady Bird)
Paul Thomas Anderson (Phantom Thread)
Guillermo Del Toro (The Shape of Water)

Melhor Filme:
Call Me By Your Name
Darkest Hour
Dunkirk
Get Out
Lady Bird
Phantom Thread
The Post
The Shape of Water
Three Billboards Outside Ebbing, Missouri

sexta-feira, 12 de janeiro de 2018

Primeiro poema publicado por Machado de Assis aos 16 anos de idade.
Em 12 de janeiro de 1855.

ELA

Seus olhos que brilham tanto,
Que prendem tão doce encanto,
Que prendem um casto amor
Onde com rara beleza,
Se esmerou a natureza
Com meiguice e com primor

Suas faces purpurinas
De rubras cores divinas
De mago brilho e condão;
Meigas faces que harmonia
Inspira em doce poesia
Ao meu terno coração!

Sua boca meiga e breve,
Onde um sorriso de leve
Com doçura se desliza,
Ornando purpúrea cor,
Celestes lábios de amor
Que com neve se harmoniza.

Com sua boca mimosa
Solta voz harmoniosa
Que inspira ardente paixão,
Dos lábios de Querubim
Eu quisera ouvir um -sim-
P’ra alívio do coração!
Vem, ó anjo de candura,
Fazer a dita, a ventura
De minh’alma, sem vigor;
Donzela, vem dar-lhe alento,
“Dá-lhe um suspiro de amor!”