Pesquisar este blog

domingo, 24 de junho de 2018

Clarice no quarto de despejo

No meio do dia
Clarice entreabre o quarto de despejo
pela fresta percebe uma mulher.
Onde estiveste à noite, Carolina?
Macabeando minhas agonias, Clarice.
Um amargor pra além da fome e do frio,
Da bica e da boca em sua secura.
De mim, escrevo não só a penúria do pão,
cravo no lixo da vida, o desespero,
uma gastura de não caber no peito,
e nem no papel.
Mas, ninguém me lê, Clarice,
Para além do resto.
Ninguém decifra em mim
a única escassez da qual não padeço,
- a solidão -
E ajustando o seu par de luvas claríssimas
Clarice futuca um imaginário lixo
e pensa para Carolina:
- a casa poderia ser ao menos de alvenaria -
E anseia ser Bitita inventando um diário:
páginas de jejum e de saciedade sobejam,
a fome nem em pedaços
alimenta a escrita clariciana.
Clarice no quarto de despejo
lê a outra, lê Carolina,
a que na cópia das palavras,
faz de si a própria inventiva.
Clarice lê :
- despejo e desejos –

Conceição Evaristo

#ConceiçãoEvaristonaABL

sábado, 23 de junho de 2018

CAROLINA NA HORA DA ESTRELA

No meio da noite
Carolina corta a hora da estrela.
Nos laços de sua família um nó
– a fome.
José Carlos masca chicletes.
No aniversário, Vera Eunice desiste
do par de sapatos,
quer um par de óculos escuros.
João José na via-crúcis do corpo,
um sopro de vida no instante-quase
a extinguir seus jovens dias.
E lá se vai Carolina
com os olhos fundos,
macabeando todas as dores do mundo...
Na hora da estrela, Clarice nem sabe
que uma mulher cata letras e escreve
“De dia tenho sono e de noite poesia”.

Conceição Evaristo


#ConceiçãoEvaristonaABL

sexta-feira, 22 de junho de 2018


Estava aqui “vagando” pelo Facebook e vendo uma quantidade enorme de postagens falando de decepções, de que as pessoas não eram o que pareciam, que perdemos amigos que não eram amigos, traições, etc ... fico pensando: por que gostamos tanto do “papel de vítimas”? Por que insistimos em ver sempre o “copo meio vazio”? Por que jogamos para o outro a responsabilidade de suprir nossas carências, necessidades, enfim de nos fazer feliz? Por que acreditamos que está tudo “lá fora”?
O que vejo é uma falta de amor, não falo aqui de amor romântico, mas de amor em sua forma mais pura, de amor sem egos, sem projeções, sem padrões, sem porquês ... amor por amor! Amor que liberta! Um amor que precisa ser achado dentro de nós mesmos e por nós mesmos, para que ele nos tome por completo e se expanda por tudo e todos!
Acredito que está na hora de nos livrarmos desta visão fatalista da vida e começar a entender que a vida é feita de ciclos, de movimento! Só porque uma pessoa não está mais convivendo conosco no dia a dia não quer dizer que esta não seja mais nossa amiga; finais de relacionamentos trazem sempre a frase: “não deu certo”, como assim não deu certo? Claro que deu certo: deu certo por um tempo! Finais, afastamentos querem dizer que a roda da vida girou que novos laços se farão, alguns se soltarão e a vida segue seu bailado nos proporcionando novos encontros ou reencontros!
O mais importante disso tudo é a gente aprender a dançar com a vida, é parar de se sentir vítima de “amigos que não eram amigos”, de “amores que não eram o que pensávamos”, de projetar nos outros o que queremos, deixarmos de querer/exigir do próximo sentimentos, ações e, principalmente, de olhar o outro como gostaríamos que estes fossem e de carregar o fardo de ser o que os outros querem que sejamos, ou seja, eliminar as expectativas, as carências, o ego de querer ser perfeito, assim seremos mais livres, menos vítimas e, por conseqüência, mais felizes!

domingo, 3 de junho de 2018

"Coragem, às vezes, é desapego. É parar de se esticar, em vão, para trazer a linha de volta. É permitir que voe sem que nos leve junto. É aceitar que a esperança há muito se desprendeu do sonho. É aceitar doer inteiro até florir de novo. É abençoar o amor, aquele lá, que a gente não alcança mais."

Ana Jácomo